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Editorial

A despedida de Diogo Mainardi

Texto em homenagem ao jornalista Diogo Mainardi

Redação Pedra Azul News

13/08/2022 - 00:00:00 | Atualizada em 20/08/2022 - 14:31:50

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Uma pessoa muito amada por mim diz com toda a razão que alguém pode ser tudo, menos chato. É verdade. Também é verdade que toda a regra comporta exceção. Essas duas verdades compõem o que sinto por Diogo Mainardi, polêmico jornalista que anunciou sua segunda aposentadoria essa semana.

Conheci os escritos de Mainardi durante minha adolescência vermelha. Sempre curioso em refutar a elite capitalista e burguesa, lia escondido os exemplares da Revista Veja que meu pai há época assinava. Como bom rebelde socialista, desvendava tudo, todas as segundas, terceiras, quartas intenções do grande capital naquelas linhas. Nada era capaz de deter a minha ânsia, exceto um paredão chamado Diogo Mainardi.

Que sujeito chato!

Claro que ele só podia estar em defesa da exploração dos pobres e oprimidos, mas era fina a sua escrita, seus argumentos e sua erudição me encantavam. Mesmo forçadamente discordando de tudo o que ele dizia, eu apreciava muito aquelas linhas. Aprendi com ele que era possível, mesmo não concordando, apreciar o que era fino. Mainardi ganhou o direito de ser chato para mim.

Lembro que naqueles tempos, eu, rebelde sem causa, confrontava meus professores (todos esquerdistas) com argumentos mainardianos que sempre eram exitosos. Cada coisa bizarra que saía daquelas reflexões. Vem-me à memória um artigo dele chamado “Bom é ser improdutivo” no qual ele demonstrava por A+B que, no Brasil, ser improdutivo era um grande negócio. Com uma requintada ironia, ele comprovava essa ridícula realidade.

Hoje, quase vinte anos depois e advogando para pequenos empresários, vejo que muitos deles, na prática, chegam à mesma conclusão de Mainardi. Conheço uma família dona de um tradicional restaurante de Vitória, com quase quarenta anos de mercado, que está decidida a fechar as portas e alugar o ponto. A conclusão é: com o aluguel do imóvel onde o restaurante funciona, ganha-se dinheiro com mais segurança, não há riscos trabalhistas, a carga tributária é muito menor, enfim, vale mais a pena fechar o negócio (que gera vários empregos diretos) e viver do aluguel. Em outras palavras, essa família entendeu nada mais nada menos que, no Brasil, bom mesmo é ser improdutivo. Ponto para o Diogo.

Depois desse contato, parei de ler a Veja por volta de 2005 quando entrei na universidade e só fui reencontrar o Diogo em 2015 em O Antagonista! Muito mais ranzinza (devem ser os anos tratando de política), menos polido, Diogo Mainardi voltou ao cotidiano dos brasileiros, agora com muito mais alcance por atuar na internet.

Sempre áspero com tudo e com todos, parece mesmo que o jornalista brasileiro residente na Europa tem uma baita de uma dor de cotovelo, uma nostalgia daquelas. Mário Sabino, seu fiel escudeiro e sócio, disse que Diogo é a pessoa mais apaixonada pelo Brasil que ele conhece. Se amor ou ódio, eu não sei. Mas o fato é que, com essa aposentaria repentina, perdemos uma figura que valia a pena ser ouvida, coisa que, infelizmente, é cada vez mais rara.

Mesmo estando quase sempre errado e sendo chato todas as vezes, Diogo Mainardi conquistou o direito de ter suas palavras levadas em conta, algo que também é um privilégio cada vez mais raro nesse mundo em que o pensamento se tornou algo tão sem valor.

Obviamente que conhecendo o temperamento dele, há de se supor que essa aposentadoria seja cancelada e que um retorno de Mainardi nos aguarda em algum futuro, não sei se distante ou próximo.

Obrigado, Diogo Mainardi! Apesar de quase sempre discordar de absolutamente tudo do que escreves, tu és o chato que eu mais admiro!

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